Como assim Capitão Marvel é da DC Comics? E não era mulher?

A DC Comics fez um filme do Shazam. Mas tão dizendo que o nome dele na verdade é Capitão Marvel?
Se você ficou mais perdido que o Capitão América descongelado, calma.
Senta que lá vem história.

A Era de Ouro dos Quadrinhos começou com o Superman, em 1938. Deste período, os personagens mais conhecidos são ele, Batman e Mulher Maravilha, todos da editora National (hoje DC Comics).
Foram os únicos três que “sobreviveram” quando os super-heróis pararam de fazer sucesso no Pós Guerra.
Mas o MAIOR campeão de vendas não era nenhum deles.
O posto cabia a um herói apelidado pelos fãs, carinhosamente, de Big Red Cheese (Queijão Vermelho): o Capitão Marvel.
Billy Fawcett, um ex-oficial da Primeira Guerra Mundial, resolveu abrir sua editora de HQ, a Fawcett Publication.

Depois de publicar alguns quadrinhos de humor, Fawcett também queria algo para competir com o Superman. O editor Bill Parker e o ilustrador C.C.Beck criaram o Captain Thunder (Capitão Trovão), um herói com poderes vindo do sobrenatural, para contrastar com a pseudo-ciência do kryptoniano.

Beck usou de modelo os atores do filme Nosferato, Fred MacMurray para ser o herói e Max Schreck para ser o vilão Dr. Sivana (no Brasil ele ganharia um L e viraria Dr. Silvana).

Os personagens apareceram no primeiro número da revista Flash Comics, de janeiro de 1940. Foi tudo feito às pressas, no que o mercado hoje chama de edições Ashcan. São protótipos de revistas, lançadas em tiragem minúscula, apenas para garantir as logomarcas. Alguns números ficavam na editora e outros iam para o departamento de registros e patentes.

Atualmente, elas valem muito dinheiro entre os colecionadores.

Infelizmente, para a Fawcett, a All-American Comics (empresa irmã da National) tinha lançado de forma “séria”, em grande tiragem e em todo o país, uma revista com o mesmo nome e apresentando o seu novo personagem Flash (o original, que no Brasil ficou conhecido como Joel Ciclone).

Posteriormente, a All-American seria comprada pela National/DC.

Assim, a Fawcett teve que rebatizar sua revista de Whiz Comics e o seu herói de Captain Marvel (Capitão Marvel).

No mês seguinte, a Whiz Comics # 1 chegou às bancas, colorida e em grande tiragem, trazendo o mais novo super-herói. Mesmo a história sendo a mesma da versão da Flash Comics, a da Whiz é considerada a estreia do personagem mais popular da Era de Ouro.

E é fácil entender seu carisma.

Na trama, o pequeno Billy Batson é um menino que ganha, do sábio Mago Shazam, a sabedoria de um rei bíblico e os poderes de cinco heróis mitológicos.

Quando grita o nome do mago, Billy se transforma no Capitão Marvel, dotado da sabedoria de Salomão, a força de Hércules, a resistência de Atlas, o poder de Zeus, a coragem de Aquiles e a velocidade de Mercúrio – figuras cujas iniciais formam a palavra Shazam.
(Sim, o app que busca músicas é uma homenagem a ele. Assim como o cabelo do Elvis Presley nos anos 50 e as roupas que usava no palco na década de 70. O Rei amava o gibi. Nunca notou que seu famoso figurino da fase Las Vegas tem uma CAPA?)

Com a magia, Billy cresce até a forma adulta ficando pronto para enfrentar o Mal.

Era como Robin e Superman no mesmo personagem.

A identificação com o público foi imediata.

Diferente de todos os outros super-heróis, o Capitão Marvel era uma criança! Exatamente como seus leitores.

Rapidamente a revista se tornou um best seller, ultrapassando a marca de mais de um milhão de exemplares vendidos a cada edição, feito que nem o Superman conseguia.

Logo, Otto Binder, um experiente escritor de pulps, veio se juntar à equipe criativa.

As histórias do Capitão Marvel ficaram mais dinâmicas e envolventes.

Foram criados os personagens Capitão Marvel Jr., a versão adolescente do Capitão Marvel – um amigo de Billy Batson que também ganhava poderes do Mago; Mary Marvel, a versão feminina do personagem – na verdade era a irmã de Batson que ganhava poderes; e diversos outros personagens de apoio, como os Tenentes Marvel.

O sucesso fez a Família Marvel se espalhar por outras revistas também, como a Wow Comics e a Master Comics. Para dar conta do trabalho, outros artistas foram chamados, como Pete Costanza e Kurt Schaffenberger.

O êxito incomodou a editora National/DC.

Da mesma forma que tinha feito com o Wonder Man (criação de Will Eisner que foi cancelada por ordem judicial), a editora de Superman resolveu acusar a Fawcett de plágio. Os dois super-heróis tinham super-poderes e um cientista maluco como arqui-inimigo: Lex Luthor e Dr. Silvana.

Mas no começo o processo não colou. A justiça americana alegou que a ÚNICA forma de concluir se era ou não plágio seria ler TODAS as histórias, coisa que NÂO iam fazer. E no fundo parecia despeito da National/DC – incomodada com ÚNICO que vendia mais que o Superman. Afinal, ela não entrou com processo contra os outros inúmeros personagens que apareceram na cola do Homem de Aço.

Mas a National/DC não desistiu.

E, em 1953, ela finalmente ganhou a ação. Depois conseguiu comprar a Fawcett e todos os seus personagens. Com isso, o Capitão Marvel foi parar na “geladeira”, permitindo que o Superman se tornasse o maior herói de todos os tempos, como gostam de falar seus materiais promocionais.

E a Capitã Marvel da Marvel?
Então.
Em novembro de 1961, chegou às bancas a Fantastic Four #1, da editora Atlas (antiga Timely, que lá na Era de Ouro brigava no mercado publicando Namor, Capitão América e Tocha Humana – o original) .

Os super-heróis tinham voltado a ser uma sensação com todas as mudanças que a DC Comics (já de nome novo) vinha desenvolvendo.

A revista da Liga da Justiça, que reunia todos os antigos e conhecidos fantasiados (Superman/Batman/Mulher Maravilha/novo Flash/novo Lanterna Verde/Aquaman…) era um best-seller.

A pedido do dono da Atlas, Martin Goodman, Stan Lee e Jack Kirby bolaram o Quarteto e o começo do Universo Marvel. O público adorou a novidade. Empolgado, Lee convenceu Goodman a mudar o nome da editora para Marvel, em homenagem à antiga revista onde apareciam Namor e Tocha Humana.

Logo a Marvel trouxe vários novos personagens como Hulk, Homem-Aranha, Homem de Ferro e Thor.

Em setembro de 1965, surgiu o super-grupo em resposta à Liga da Justiça: Os Vingadores.

Foi o AUGE dos super-heróis.

Na TV, o seriado do Batman (1966/1968) com Adam West e Burt Ward era uma febre.

Como era a “nova editora” Marvel.

A partir da metade da década de 60, seus heróis também tinham ido parar na TV.

Em 1966, foram produzidos desenhos para a ABC Network a partir das revistas. A falta de qualidade (os personagens, feitos das próprias páginas dos gibis, ficavam estáticos, mexendo apenas a boca) tornaram eles um clássico.

Em 1965, Lee criou o fã-clube Marvel, mantendo um diálogo aberto nas HQs com os leitores, a exemplo do que fazia o editor Julius Schwartz na Liga da Justiça.

Homem-Aranha e Quarteto Fantástico também foram parar na TV, em desenhos melhores elaborados. O do Quarteto era produzido pelos estúdios Hanna-Barbera.

Com todo o barulho, Goodman deixou Lee lançar novas revistas em 1968.

Lembra que a DC tinha colocado o Capitão Marvel na “geladeira” e não publicava mais histórias dele?

Stan Lee não ia correr o risco da concorrente ter um herói com o nome da SUA editora. Um que tinha TODO DIREITO de usar o nome.  Malandramente, ele aproveitou essa hibernação do Capitão Marvel e publicou, em maio de 1968, Captain Marvel # 1.

O novo personagem, um soldado alienígena da raça Kree chamado Mar-vell, é apenas uma desculpa para garantir o título já que o famoso Queijão Vermelho estava fora das bancas. Quando a DC foi relançar as aventuras de Billy Batson, em 1973, teve que usar o título Shazam.

De lá pra cá, o Capitão Marvel da DC usa apenas a marca Shazam, como confirma o filme que chegou aos cinemas em abril de 2019. Nas páginas das revistas, às vezes, os outros heróis até chamam ele pelo nome original.

A Capitã Marvel da Marvel, filme lançado em março de 2019, é a versão feminina do tal alienígena Kree. Ela é humana e ganhou os poderes numa explosão quando seu DNA se “fundiu” com o dele. Já usou o nome de Miss Marvel e…

Isso é papo pra outro post.

#CapitãoMarvel #Shazam #Comics #DC #Marvel

Referências

Moreau, Diego. Cadê o Gibi que estava aqui – Maus e a evolução da História em Quadrinhos
Dissertação de Mestrado. Unisul. 2007.
http://pergamum.unisul.br/pergamum/pdf/89833_Diego.pdf

Livros

CAGNIN, Antonio Luiz. Os quadrinhos. São Paulo: Ática, 1975.GUEDES, Roberto. Quando surgem os super-heróis. São Paulo: Opera Graphica, 2004.
HOWE, Sean. Marvel Comics A História Secreta. São Paulo. LeYa. 2013.
JONES, Gerard. Homens do Amanhã. São Paulo: Conrad, 2006.
MOYA, Álvaro de. Shazam!. São Paulo: Editora Perspectiva, 1970.
PATATI, Carlos; BRAGA, Flávio. Almanaque dos quadrinhos: 100 anos de uma mídia popular. Rio de Janeiro: Ediouro, 2006
VOLOJ, Julian e CAMPI, Thomas. A história de Joe Shuster: O artista por trás do Superman. São Paulo. Aleph: 2018.

3 comentários em “Como assim Capitão Marvel é da DC Comics? E não era mulher?”

  1. Gostei do texto, mas foi um tanto corrido e confundiu lá no meio, a DC não comprou em 1953, ela venceu o processo e a Fawcett deixou de publicar o herói, em 1972, a DC resolveu licenciar, mas teve um problema quando foi lançar no ano seguinte, já que a Marvel já estava com o título Captain Marvel, então veio a ideia de chamar o gibi de Shazam!, ela só comprou em 1991, quando o personagem já pertencia a CBS Publishing.

    • Olá, Quiof. Muito obrigado pelo feedback. Você poderia, por favor, passar a fonte? Estou pesquisando mais sobre o personagem para um trabalho nosso e o que tenho nas fontes citadas ali diz o que está no texto. De novo, muito obrigado. Essa troca é maravilhosa.

  2. O Capitão Marvel (DC Comics) estreou em Whiz Comics # 2, não na edição anterior… além disso, o Capitão Marvel (Marvel Comics) é de 1967, não de 1968!

    De resto, o Quiof também possui razão!

    Caso você mesmo queira ou precise confirmar isso tudo, há vários vídeos do YouTube com fontes confiáveis!

    P.S.: Stan Lee não foi malandro, pois é como já me disse uma amiga pessoal minha: “O tesouro é do aventureiro que chegar primeiro!”! E respeite a memória do homem também!

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